SANTA MARIA E EU
I - UM DIA EU FUI PRA LÁ
Cheguei a Santa Maria no dia 12 de maio de 1959, às 6 horas da manhã.
Até a véspera desse dia eu morava em Porto Alegre, onde nasci cerca de um ano antes da famosa e histórica “Enchente de 1941” e onde vivi até “sentar praça” no Exército Brasileiro.
Inicialmente servi da 3ª CDS (Terceira Companhia Depósito de Subsistência) e fiz o curso para Cabo no ERMI/3 (Estabelecimento Regional de Material de Intendência da Terceira Região Militar). Depois disto fui transferido para o Parque Regional de Moto-Mecanização /3. Este preâmbulo ajuda, penso, a esclarecer um pouco os traumas iniciais por que passei e que adiante vocês vão conhecer.
Espécime genuinamente urbano – como sempre me identifiquei – nunca saí de Porto Alegre, onde dei meus primeiros passos, vivi a melhor das infâncias que alguém possa almejar, curti minha adolescência e idealizei todos os sonhos que podem ser sonhados. Ao ingressar no Serviço Militar, as unidades onde servi situavam-se no Centro da Cidade, em área nobre, cercada de história e de cultura que se podia, literalmente, respirar a cada passo.
Pois bem. O Parque Regional de Moto-Mecanização da 3ª Região Militar ficava na Rua General Portinho, bem ali na Praça da Harmonia onde está hoje a Praça Brigadeiro Sampaio. Eram instalações antigas, com pavilhões de madeira e o lugar já estava por demais acanhado para abrigar o aquartelamento. Em vista disto, e por imposições de Comando, o Parque de Moto, como o chamávamos, foi transferido para Santa Maria, no “coração do Estado”. Tal transferência fazia parte de uma reestruturação pela qual o Exército estava passando. O efetivo, em vista das transferências que vinham sendo feitas, já estava reduzido a um pequeno destacamento, pois a maior parte do material, do armamento, equipamento e pessoal já estava em Santa Maria, sendo deslocada para lá por escalões.
Até a véspera desse dia eu morava em Porto Alegre, onde nasci cerca de um ano antes da famosa e histórica “Enchente de 1941” e onde vivi até “sentar praça” no Exército Brasileiro.
Inicialmente servi da 3ª CDS (Terceira Companhia Depósito de Subsistência) e fiz o curso para Cabo no ERMI/3 (Estabelecimento Regional de Material de Intendência da Terceira Região Militar). Depois disto fui transferido para o Parque Regional de Moto-Mecanização /3. Este preâmbulo ajuda, penso, a esclarecer um pouco os traumas iniciais por que passei e que adiante vocês vão conhecer.
Espécime genuinamente urbano – como sempre me identifiquei – nunca saí de Porto Alegre, onde dei meus primeiros passos, vivi a melhor das infâncias que alguém possa almejar, curti minha adolescência e idealizei todos os sonhos que podem ser sonhados. Ao ingressar no Serviço Militar, as unidades onde servi situavam-se no Centro da Cidade, em área nobre, cercada de história e de cultura que se podia, literalmente, respirar a cada passo.
Pois bem. O Parque Regional de Moto-Mecanização da 3ª Região Militar ficava na Rua General Portinho, bem ali na Praça da Harmonia onde está hoje a Praça Brigadeiro Sampaio. Eram instalações antigas, com pavilhões de madeira e o lugar já estava por demais acanhado para abrigar o aquartelamento. Em vista disto, e por imposições de Comando, o Parque de Moto, como o chamávamos, foi transferido para Santa Maria, no “coração do Estado”. Tal transferência fazia parte de uma reestruturação pela qual o Exército estava passando. O efetivo, em vista das transferências que vinham sendo feitas, já estava reduzido a um pequeno destacamento, pois a maior parte do material, do armamento, equipamento e pessoal já estava em Santa Maria, sendo deslocada para lá por escalões.
Vocês não imaginam o que eu esperneei para não ir. Usei de todos os estratagemas que a minha criatividade foi capaz de engendrar. Assim, consegui adiar por algum tempo a minha movimentação. Certo dia não deu mais. Só faltava meia dúzia de “guerreiros” MAIS EU para serem deportados. Então, finalmente, capitulei. Afinal “a voz do dever me chamava”. “Seja o que Deus quiser”!...
II - COMO CHEGUEI
Na noite de 11 de maio nos dirigimos à Estação da Viação Férrea, que ficava ali, na Voluntários da Pátria, esquina da Conceição e abrangia toda a área onde se encontra, hoje, a Estação Rodoviária. Digo “nos dirigimos” porque que não fui sozinho. Éramos nove. Praticamente os últimos, pois ainda ficaram alguns para o “rescaldo”. Eu comandava a turma, pois entre estes eu era o “mais antigo”. Tinha a missão de conduzir a “equipe” e apresentá-la, no destino, ao meu novo Comandante.
Com o “ofício de apresentação” no bolso, embarcamos num vagão de 2ª Classe do trem noturno, que saía de Porto Alegre exatamente às 21 horas e chegava a Santa Maria pontualmente às seis da manhã do dia seguinte. Era uma viagem de nove horas passando por uma porção de pequenas estações (Vasconcellos Jardim, General Luz, Fanfa, Ramiz Galvão…) e diversos lugarejos que para mim eram novidade. Íamos fardados, com o uniforme impecável, engomado, sapatos pretos bem engraxados, brilhando, a fivela metálica do cinto, reluzente devido ao “brasso”, (polidor que fazia parte de nosso “kit”), cabelo cortado a "zero” e o coração um tanto apreensivo e cheio de expectativas.
Depois de uma noite passada em claro, sustentada por café preto e sanduíches servidos no vagão-restaurante, o trem foi diminuído sua marcha e ao som do apito da “Maria-fumaça” chegamos ao destino. Estávamos em Santa Maria. Santa Maria da Boca do Monte!
Com o “ofício de apresentação” no bolso, embarcamos num vagão de 2ª Classe do trem noturno, que saía de Porto Alegre exatamente às 21 horas e chegava a Santa Maria pontualmente às seis da manhã do dia seguinte. Era uma viagem de nove horas passando por uma porção de pequenas estações (Vasconcellos Jardim, General Luz, Fanfa, Ramiz Galvão…) e diversos lugarejos que para mim eram novidade. Íamos fardados, com o uniforme impecável, engomado, sapatos pretos bem engraxados, brilhando, a fivela metálica do cinto, reluzente devido ao “brasso”, (polidor que fazia parte de nosso “kit”), cabelo cortado a "zero” e o coração um tanto apreensivo e cheio de expectativas.
Depois de uma noite passada em claro, sustentada por café preto e sanduíches servidos no vagão-restaurante, o trem foi diminuído sua marcha e ao som do apito da “Maria-fumaça” chegamos ao destino. Estávamos em Santa Maria. Santa Maria da Boca do Monte!
Desembarcamos, com os nossos “apetrechos” acondicionados em “sacos de viagem” e nos encaminhamos para a saída da Estação. Uma viatura nos aguardava. Tinha chovido bastante e fazia um frio terrível, muito ao contrário do que seria de se esperar do famoso “veranico de maio”.
Como “chefe da viatura”, fui na “boléia”, isto é, na cabine ao lado do motorista. Subimos pela Avenida Rio Branco e entramos à direita na Rua Dr. Bozano, seguindo na direção do “Sétimo”. Lá em cima, dobramos para a direita, no trecho da Av. Borges de Medeiros até a esquina da “Praça 112”, um ponto de táxi tradicional, assim chamado devido ao número do telefone. Dali, virando à esquerda, tomamos a Venâncio Aires, onde, já nas proximidades da “Sotéia” (*) entramos no “Passo da Areia” chegando até à entrada do Quartel.
O Passo da Areia era uma estrada primitiva que muito mais do que areia tinha o solo predominantemente de argila avermelhada que, quando molhada, transformava-se numa pista mole e escorregadia.
Não esqueçamos que durante toda a noite havia chovido, portanto o cenário para a “tragédia” estava pronto, aguardando apenas a chegada dos protagonistas. Foi assim que na frente do portão – uma cancela rústica e sem qualquer finalidade prática, que eu pudesse detectar - ao manobrar para entrar no Quartel, o motorista abriu um pouco demais a curva, perdeu o controle da direção e a viatura derrapou no barro liso. Depois de uma volta quase completa sobre si mesma inclinou-se numa valeta e atolou até a metade das rodas.
O acidente não chegou a causar-nos um grande susto, mas as conseqüências foram bem pouco agradáveis e requeriam uma pronta iniciativa e rápida solução. “Desce todo mundo prá desatolar o “QT”! (**) – ordenei. E como quem comanda tem que dar o exemplo, lá fui eu, barro a dentro, seguido pelo motorista e pelos demais, com o nosso uniforme impecável, que deveria ser o nosso cartão de apresentação. (***)
Resultado: depois de um trabalho hercúleo, desatolamos a viatura e embarcamos. Nosso estado era deplorável, pois estávamos, literalmente, com barro até o pescoço. Mas não nos deixamos abater. Adentramos garbosamente à nossa nova Unidade, onde fomos recebidos de forma cavalheiresca pelos nossos superiores e depois com uma tremenda gozação de parte dos demais que nos esperavam ansiosos para aliviar a escala de serviço.
Como “chefe da viatura”, fui na “boléia”, isto é, na cabine ao lado do motorista. Subimos pela Avenida Rio Branco e entramos à direita na Rua Dr. Bozano, seguindo na direção do “Sétimo”. Lá em cima, dobramos para a direita, no trecho da Av. Borges de Medeiros até a esquina da “Praça 112”, um ponto de táxi tradicional, assim chamado devido ao número do telefone. Dali, virando à esquerda, tomamos a Venâncio Aires, onde, já nas proximidades da “Sotéia” (*) entramos no “Passo da Areia” chegando até à entrada do Quartel.
O Passo da Areia era uma estrada primitiva que muito mais do que areia tinha o solo predominantemente de argila avermelhada que, quando molhada, transformava-se numa pista mole e escorregadia.
Não esqueçamos que durante toda a noite havia chovido, portanto o cenário para a “tragédia” estava pronto, aguardando apenas a chegada dos protagonistas. Foi assim que na frente do portão – uma cancela rústica e sem qualquer finalidade prática, que eu pudesse detectar - ao manobrar para entrar no Quartel, o motorista abriu um pouco demais a curva, perdeu o controle da direção e a viatura derrapou no barro liso. Depois de uma volta quase completa sobre si mesma inclinou-se numa valeta e atolou até a metade das rodas.
O acidente não chegou a causar-nos um grande susto, mas as conseqüências foram bem pouco agradáveis e requeriam uma pronta iniciativa e rápida solução. “Desce todo mundo prá desatolar o “QT”! (**) – ordenei. E como quem comanda tem que dar o exemplo, lá fui eu, barro a dentro, seguido pelo motorista e pelos demais, com o nosso uniforme impecável, que deveria ser o nosso cartão de apresentação. (***)
Resultado: depois de um trabalho hercúleo, desatolamos a viatura e embarcamos. Nosso estado era deplorável, pois estávamos, literalmente, com barro até o pescoço. Mas não nos deixamos abater. Adentramos garbosamente à nossa nova Unidade, onde fomos recebidos de forma cavalheiresca pelos nossos superiores e depois com uma tremenda gozação de parte dos demais que nos esperavam ansiosos para aliviar a escala de serviço.
Assim, nessas condições, teve início uma nova fase de minha vida.
III - O QUE É QUE ESTOU FAZENDO AQUI!?...
O quartel ainda estava sendo construído. Havia três pavilhões – dois prontos, o de Alojamentos, enfermaria e Gabinete do Comando e o do Rancho, com locais de aprovisionamento e refeitórios, e um – o maior deles – em fase adiantada de construção. Este destinava-se às oficinas e dava acesso a uma linha férrea, pela qual chegava todo o equipamento, máquinas, ferramentas e demais tralhas. As obras eram de responsabilidade da CRO/3 (Comissão Regional de Obras da Terceira Região Militar) e contavam com apoio de engenheiros e operários civis de alta qualificação. O número destes, entretanto, era um pouco deficiente, de modo que os recursos com “mão de obra não especializada”, para os trabalhos pesados, eram supridos pelos militares menos graduados – eu era um deles – e pelos soldados. Sendo assim, imaginem o que me aguardava!... Mas vamos pular esta parte, se não eu me desvio demais do tema principal que começa a seguir.
Minha adaptação à Cidade foi lenta e trabalhosa. Se nessa época Porto Alegre ainda não era a Metrópole que conhecemos agora, imaginemos Santa Maria. Esta era realmente pequena e, não só pequena, como estranha para os meus hábitos. Logo percebi que eu não passava de mero alienígena. Vi que as pessoas eram boas, mas os costumes do lugar eram difíceis de assimilar. Seus hábitos, linguajar, modos de pensar, não eram exatamente os mesmos que eu entendia.
Ao chegar, não tinha amigos. Não conhecia ninguém. Não conhecia nada, nem sabia onde ir ou o quê fazer. Eu gostava de cinema. Gostava de teatro. Gostava de música. Em Santa Maria havia apenas dois cinemas, o Imperial e o Independência. Só muito depois surgiu uma terceira sala, o Glória. Teatro também não havia, que eu tenha conhecido.
Felizmente descobri uma biblioteca pública que funcionava no salão principal do prédio do atual Teatro Treze de Maio. Ali passei muitas horas das que conseguia dispor nas minhas folgas. Existia duas ou três emissoras de rádio. Lembro da Santa-Mariense, da Guarathan e, acho que da Imembuí. Durante a maior parte do tempo tocavam músicas gauchescas, o que, vocês sabem, nunca foi meu gênero preferido. Cada vez que eu ligava o meu radinho de pilhas, era brindado com a voz de um apresentador e cantor nativista conhecido pelo nome de “Cerejinha”. Ele era muito querido pelos “nativos”, mas eu já não conseguia mais digerir o homem, pois era só o que se ouvia. Vez por outra eu me perguntava - “o que é que estou fazendo aqui!?”
Todo mundo tomava chimarrão. Tudo bem! Gosto é gosto. Mas daí a ficarem me oferecendo o “mate” a todo o momento e a me questionarem, cada vez que eu agradecia, recusando - “Mas tu não é gaúcho?” – já é outra história. Chega um momento em que o sujeito ou entra na festa ou num processo depressivo. Foi este último estágio que quase me nocauteou.
Onde quer que eu estivesse, me olhavam como seu fosse um E.T. e sempre alguém me perguntava de onde eu era. Quando lhes dizia que era de Porto Alegre, enchiam-me de perguntas sobre como era a Capital, se fazia muito barulho, se era verdade que as pessoas viviam sempre com pressa e coisas assim. Então eu aproveitava e falava da minha Cidade, nunca deixando passar a oportunidade para sadicamente exagerar tudo o que pudesse. Como é doce a vingança!...
E mais uma confidência: terminei conhecendo o VENTO NORTE! Vocês, que não moram em Santa Maria e não tiveram o privilégio de conviver com ele, não conseguem avaliar o horror que é aquilo. Só tendo nascido lá para aceitar passivamente aquele fenômeno meteorológico que derruba o astral do espírito mais elevado que ouse enfrenta-lo.
O que atenuava um pouco o meu estado de ânimo era o fato de Santa Maria ser importante centro ferroviário (o que até hoje é atestado pelas inúmeras referências e parte ainda preservada daquele patrimônio) e isto me lembrava um pouco o meu avô materno e padrinho João Silveira Gonçalves, nascido em 8 de fevereiro de 1858 e falecido em 24 de junho de 1944, que era ferroviário e andou trabalhando por lá entre os anos 30 e 40, literalmente "trilhando" (eu não podia perder este trocadilho, compreendem?) estes caminhos que eu agora percorria. Meu “vô” João era, de certa forma, em muitas horas, o anjo que me trazia algum alento.
Lentamente fui me entrosando com os santa-marienses e a minha obsessão pelo “o que é que eu estou fazendo aqui!?” já não me atormentava com a intensidade do início. Afinal, “o que não tinha remédio, remediado estava”, como dizia minha mãe, a “dona Evinha” (filha mais velha do Vô João). Todavia era impossível impedir que a pergunta obsessiva voltasse a me assaltar quando eu menos a esperava.
Porém, pouco a pouco fui descobrindo que o bicho não era tão feio como me pareceu. As pessoas eram amigas. Esforçavam-se por me deixar à vontade. Me acolhiam com carinho e não mediam esforço para que eu me sentisse em casa. Aprendi a conversar com eles e a compreender que tínhamos muito mais coisas a nos unir do que a nos separar. E eles me ajudaram a amadurecer. E com eles – acreditem! - eu cresci!...
Minha adaptação à Cidade foi lenta e trabalhosa. Se nessa época Porto Alegre ainda não era a Metrópole que conhecemos agora, imaginemos Santa Maria. Esta era realmente pequena e, não só pequena, como estranha para os meus hábitos. Logo percebi que eu não passava de mero alienígena. Vi que as pessoas eram boas, mas os costumes do lugar eram difíceis de assimilar. Seus hábitos, linguajar, modos de pensar, não eram exatamente os mesmos que eu entendia.
Ao chegar, não tinha amigos. Não conhecia ninguém. Não conhecia nada, nem sabia onde ir ou o quê fazer. Eu gostava de cinema. Gostava de teatro. Gostava de música. Em Santa Maria havia apenas dois cinemas, o Imperial e o Independência. Só muito depois surgiu uma terceira sala, o Glória. Teatro também não havia, que eu tenha conhecido.
Felizmente descobri uma biblioteca pública que funcionava no salão principal do prédio do atual Teatro Treze de Maio. Ali passei muitas horas das que conseguia dispor nas minhas folgas. Existia duas ou três emissoras de rádio. Lembro da Santa-Mariense, da Guarathan e, acho que da Imembuí. Durante a maior parte do tempo tocavam músicas gauchescas, o que, vocês sabem, nunca foi meu gênero preferido. Cada vez que eu ligava o meu radinho de pilhas, era brindado com a voz de um apresentador e cantor nativista conhecido pelo nome de “Cerejinha”. Ele era muito querido pelos “nativos”, mas eu já não conseguia mais digerir o homem, pois era só o que se ouvia. Vez por outra eu me perguntava - “o que é que estou fazendo aqui!?”
Todo mundo tomava chimarrão. Tudo bem! Gosto é gosto. Mas daí a ficarem me oferecendo o “mate” a todo o momento e a me questionarem, cada vez que eu agradecia, recusando - “Mas tu não é gaúcho?” – já é outra história. Chega um momento em que o sujeito ou entra na festa ou num processo depressivo. Foi este último estágio que quase me nocauteou.
Onde quer que eu estivesse, me olhavam como seu fosse um E.T. e sempre alguém me perguntava de onde eu era. Quando lhes dizia que era de Porto Alegre, enchiam-me de perguntas sobre como era a Capital, se fazia muito barulho, se era verdade que as pessoas viviam sempre com pressa e coisas assim. Então eu aproveitava e falava da minha Cidade, nunca deixando passar a oportunidade para sadicamente exagerar tudo o que pudesse. Como é doce a vingança!...
E mais uma confidência: terminei conhecendo o VENTO NORTE! Vocês, que não moram em Santa Maria e não tiveram o privilégio de conviver com ele, não conseguem avaliar o horror que é aquilo. Só tendo nascido lá para aceitar passivamente aquele fenômeno meteorológico que derruba o astral do espírito mais elevado que ouse enfrenta-lo.
O que atenuava um pouco o meu estado de ânimo era o fato de Santa Maria ser importante centro ferroviário (o que até hoje é atestado pelas inúmeras referências e parte ainda preservada daquele patrimônio) e isto me lembrava um pouco o meu avô materno e padrinho João Silveira Gonçalves, nascido em 8 de fevereiro de 1858 e falecido em 24 de junho de 1944, que era ferroviário e andou trabalhando por lá entre os anos 30 e 40, literalmente "trilhando" (eu não podia perder este trocadilho, compreendem?) estes caminhos que eu agora percorria. Meu “vô” João era, de certa forma, em muitas horas, o anjo que me trazia algum alento.
Lentamente fui me entrosando com os santa-marienses e a minha obsessão pelo “o que é que eu estou fazendo aqui!?” já não me atormentava com a intensidade do início. Afinal, “o que não tinha remédio, remediado estava”, como dizia minha mãe, a “dona Evinha” (filha mais velha do Vô João). Todavia era impossível impedir que a pergunta obsessiva voltasse a me assaltar quando eu menos a esperava.
Porém, pouco a pouco fui descobrindo que o bicho não era tão feio como me pareceu. As pessoas eram amigas. Esforçavam-se por me deixar à vontade. Me acolhiam com carinho e não mediam esforço para que eu me sentisse em casa. Aprendi a conversar com eles e a compreender que tínhamos muito mais coisas a nos unir do que a nos separar. E eles me ajudaram a amadurecer. E com eles – acreditem! - eu cresci!...
IV - GENTE DA TERRA
Conheci pessoas que passaram, de alguma sorte, a fazer parte da minha vida. Nunca esqueço da Dona Mariazinha, a lavadeira, uma senhora baixinha, súper simpática, conversadeira como ela só. Ela morava nas proximidades do quartel e era pessoa estimada por todos. O carinho com que ela cuidava dos meus uniformes era, por assim dizer, sobrenatural. Sempre que eu os levava, ficávamos conversando. Era pessoa humilde, mas culta. Pelo menos suas experiências de vida eram de uma riqueza que me surpreendia. Ainda assim, às vezes “escorregava” em certos questionamentos. Lembro deste, por exemplo: “Já me contaram que Porto Alegre é muito bonita, mas pelo que sei, logo, logo, a cidade vai afundar e desaparecer”. Como assim? perguntei. Então ela explicou: “É que lá tem muitos edifícios e o peso deles vai fazer tudo desabar”. A preocupação de Dona Mariazinha tinha origem, certamente, na comparação que ela fazia entre a realidade de Santa Maria e o que ela ouvia sobre Porto Alegre.
A “Cidade Universitária”, como depois veio a ser denominada (nesses longínquos anos ainda não era “Universitária” pois a Universidade Federal de Santa Maria só veio a ser implantada em 1960) tinha poucas construções de vulto. Poucas, mesmo. Edifícios mais altos, que eu lembro, eram o das Casas Eny, na Avenida Rio Branco, de arquitetura muito bonita – pelo menos eu gostava dele – e o “Taperinha”, imponente, de construção recente, que enchia de orgulho os santa-marienses. Pouco depois, concluiu-se a Galeria do Comércio, sob um magnífico prédio de muitos andares – no momento não sei dizer quantos, mas acredito que uns quinze, ou mais. Só no decorrer dos anos seguintes é que surgiram o Edifício do Banrisul, na esquina do Acampamento com a Praça Saldanha Marinho e outros que foram sendo, lentamente, erigidos até os anos 70 e que deram à Cidade ares de modernidade.
Mas apesar da minha má vontade inicial, houve lugares e coisas com os quais simpatizei desde os primeiros contatos. Por exemplo, a Estação da Viação Férrea (primeiro lugar que conheci), com intenso movimento de trens para todo o Estado, já que Santa Maria era o mais importante Centro Ferroviário do Rio Grande do Sul. Em seguida, a Catedral Diocesana, (atualmente é Arquidiocesana, pois a Cidade foi elevada à categoria de Arquidiocese), com as belíssimas pinturas de Aldo Locatelli. Linda! A Galeria Chami, outro, a única existente quando cheguei, lugar aprazível, pitoresco, onde se podia tomar um café maravilhoso. O cheiro delicioso de um amendoim com chocolate, que, se não me engano, chamavam de “garapinha” e que até hoje é encontrado na "Primeira Quadra" da Bozano. A Praça Saldanha Marinho, com seu belíssimo chafariz. E, naturalmente, a topografia do lugar, com seus morros, a subida do Perau, a Serra em direção a Itaara (atualmente Itaara é Município, emancipado de Santa Maria), o Rio Vacacaí, o Rio Verde…
Sobre personagens inesquecíveis, ainda questiono-me sobre um, cujo nome completo nunca fiquei sabendo. Era chamado Piaçon. Acho que a grafia é esta. Ou talvez “Piasson”. Pois o “seu” Piaçon era um sujeito ao mesmo tempo temido e respeitado por todo mundo. Tinha boa aparência. Andava sempre bem pilchado, muito elegante em seus trajes campeiros. O cavalo encilhado com bonitos arreios era o seu meio de locomoção. Era um mito na região. Atribuíam-lhe mil e uma peripécias, muitas delas bem pouco recomendáveis. Tinha fama de valentão e contavam que em seu currículo havia um bom número de homicídios. Diziam que o cujo não levava ninguém prá compadre. Era jogador, mulherengo (???) e resolvia as paradas à bala. Apesar disto, era um homem educado, de bons modos e se comportava, com freqüência, de modo cavalheiresco. Uma única vez eu o vi, saindo de um boteco perto do quartel e, sou obrigado a reconhecer, o sujeito tinha mesmo uma bela figura. Nunca fiquei sabendo a verdade sobre o famoso Piaçon. A última notícia que tive dele, foi no dia em que um rapaz, desafeto seu, vingou-se pegando-o de surpresa e descarregando sobre ele sua arma, dando fim à vida do lendário cavaleiro. Isto ocorreu há mais de cinqüenta anos! Não sei se algum historiador ou pesquisador já se interessou em resgatar a verdade sobre este homem cheio de contradições em sua biografia, até onde eu o sei. Talvez valesse a pena e muitas páginas interessantes poderiam ser introduzidas na história de Santa Maria.
A “Cidade Universitária”, como depois veio a ser denominada (nesses longínquos anos ainda não era “Universitária” pois a Universidade Federal de Santa Maria só veio a ser implantada em 1960) tinha poucas construções de vulto. Poucas, mesmo. Edifícios mais altos, que eu lembro, eram o das Casas Eny, na Avenida Rio Branco, de arquitetura muito bonita – pelo menos eu gostava dele – e o “Taperinha”, imponente, de construção recente, que enchia de orgulho os santa-marienses. Pouco depois, concluiu-se a Galeria do Comércio, sob um magnífico prédio de muitos andares – no momento não sei dizer quantos, mas acredito que uns quinze, ou mais. Só no decorrer dos anos seguintes é que surgiram o Edifício do Banrisul, na esquina do Acampamento com a Praça Saldanha Marinho e outros que foram sendo, lentamente, erigidos até os anos 70 e que deram à Cidade ares de modernidade.
Mas apesar da minha má vontade inicial, houve lugares e coisas com os quais simpatizei desde os primeiros contatos. Por exemplo, a Estação da Viação Férrea (primeiro lugar que conheci), com intenso movimento de trens para todo o Estado, já que Santa Maria era o mais importante Centro Ferroviário do Rio Grande do Sul. Em seguida, a Catedral Diocesana, (atualmente é Arquidiocesana, pois a Cidade foi elevada à categoria de Arquidiocese), com as belíssimas pinturas de Aldo Locatelli. Linda! A Galeria Chami, outro, a única existente quando cheguei, lugar aprazível, pitoresco, onde se podia tomar um café maravilhoso. O cheiro delicioso de um amendoim com chocolate, que, se não me engano, chamavam de “garapinha” e que até hoje é encontrado na "Primeira Quadra" da Bozano. A Praça Saldanha Marinho, com seu belíssimo chafariz. E, naturalmente, a topografia do lugar, com seus morros, a subida do Perau, a Serra em direção a Itaara (atualmente Itaara é Município, emancipado de Santa Maria), o Rio Vacacaí, o Rio Verde…
Sobre personagens inesquecíveis, ainda questiono-me sobre um, cujo nome completo nunca fiquei sabendo. Era chamado Piaçon. Acho que a grafia é esta. Ou talvez “Piasson”. Pois o “seu” Piaçon era um sujeito ao mesmo tempo temido e respeitado por todo mundo. Tinha boa aparência. Andava sempre bem pilchado, muito elegante em seus trajes campeiros. O cavalo encilhado com bonitos arreios era o seu meio de locomoção. Era um mito na região. Atribuíam-lhe mil e uma peripécias, muitas delas bem pouco recomendáveis. Tinha fama de valentão e contavam que em seu currículo havia um bom número de homicídios. Diziam que o cujo não levava ninguém prá compadre. Era jogador, mulherengo (???) e resolvia as paradas à bala. Apesar disto, era um homem educado, de bons modos e se comportava, com freqüência, de modo cavalheiresco. Uma única vez eu o vi, saindo de um boteco perto do quartel e, sou obrigado a reconhecer, o sujeito tinha mesmo uma bela figura. Nunca fiquei sabendo a verdade sobre o famoso Piaçon. A última notícia que tive dele, foi no dia em que um rapaz, desafeto seu, vingou-se pegando-o de surpresa e descarregando sobre ele sua arma, dando fim à vida do lendário cavaleiro. Isto ocorreu há mais de cinqüenta anos! Não sei se algum historiador ou pesquisador já se interessou em resgatar a verdade sobre este homem cheio de contradições em sua biografia, até onde eu o sei. Talvez valesse a pena e muitas páginas interessantes poderiam ser introduzidas na história de Santa Maria.
Aqui era o bar do Seu Eureka. O prédio ainda existe, praticamente igual ao que era. Está muito bem conservado. |
O “seu Eureka”, como o chamavam, era um gringo enorme, gozador, risonho, que além de servir pinga e cerveja à seleta clientela do seu estabelecimento, fazia jogo do bicho e emprestava o telefone 278 prá todo mundo que precisasse. Fiz amizade com ele, com sua esposa e com os filhos, cujas idades eram próximas à minha.
Pois foi graças a uma bolada enorme que ganhei no jogo do bicho, com o milhar 0278 que “carreguei” na cabeça, do primeiro ao quinto e invertido do primeiro ao quinto, feito no “Eureka” que, certo dia, consegui colocar o aluguel em dia e pagar alguns meses adiantados. Foi um dia memorável, em que todo o pessoal do “estabelecimento” encheu a cara por minha conta e ainda fiquei com um envelope enorme, recheado com fantástica quantidade de encantadoras cédulas – embora muitas delas bem "flageladas", como era comum naquelas eras – que me tiraram do maior aperto.
O “seu” Xisto, da pensão, era outra figura sensacional. Gostava de “umas que outras”. Para ele tudo estava sempre bem. Podia-se atrasar o aluguel que ele nem esquentava a cabeça. A Dona Cecília, porém, era terrível. Com ela não tinha moleza. Não pagava, ela reunia os “pertences” do hóspede e botava no olho da rua. Mas eram arroubos passageiros, pois bastava uma boa conversa e ela abria seu coração enorme de mãezona e recebia de volta os “seus filhos”.
E houve o Tenente Carrion, dentista e piloto do Aero Clube de Santa Maria. No dia em que morreu estava fazendo o que mais gostava: pilotava seu avião predileto. Uma manobra errada? Falha mecânica? Fatalidade? Não sei a resposta.
E o Mário Pezzi, outro ás do Aero Clube, mas que dirigindo automóvel era o maior “barbeiro” (“pé-de-chumbo”) que a Cidade já conheceu. E os filatelistas – o “seu” Goetz, o Garbeiro e o Jairo, da Associação Filatélica e Numismática Santa-Mariense, à qual pertenci e de que cheguei a ser secretário, além do Helmuth, da Seção de Filatelia dos Correios… Muita gente boa, que deixou saudade de uma época que permanece viva na minha memória.
Bons e saudosos tempos!…
O “seu” Xisto, da pensão, era outra figura sensacional. Gostava de “umas que outras”. Para ele tudo estava sempre bem. Podia-se atrasar o aluguel que ele nem esquentava a cabeça. A Dona Cecília, porém, era terrível. Com ela não tinha moleza. Não pagava, ela reunia os “pertences” do hóspede e botava no olho da rua. Mas eram arroubos passageiros, pois bastava uma boa conversa e ela abria seu coração enorme de mãezona e recebia de volta os “seus filhos”.
E houve o Tenente Carrion, dentista e piloto do Aero Clube de Santa Maria. No dia em que morreu estava fazendo o que mais gostava: pilotava seu avião predileto. Uma manobra errada? Falha mecânica? Fatalidade? Não sei a resposta.
E o Mário Pezzi, outro ás do Aero Clube, mas que dirigindo automóvel era o maior “barbeiro” (“pé-de-chumbo”) que a Cidade já conheceu. E os filatelistas – o “seu” Goetz, o Garbeiro e o Jairo, da Associação Filatélica e Numismática Santa-Mariense, à qual pertenci e de que cheguei a ser secretário, além do Helmuth, da Seção de Filatelia dos Correios… Muita gente boa, que deixou saudade de uma época que permanece viva na minha memória.
Bons e saudosos tempos!…
V - AGORA TAMBÉM SOU UM SANTA-MARIENSE
A pergunta – “O que é que estou fazendo aqui!?…” – volta meia, por muito tempo, ainda vinha-me à mente.
Queiramos ou não, certas situações, por mais que nos esforcemos para exorcismar, permanecem obcecando o nosso cérebro. Desde aquela manhã chuvosa de 12 de maio de 1959 eu vinha me propondo a ir embora de Santa Maria. Ali não era o meu lugar e grande parte do tempo eu passava literalmente deprimido, embora me esforçasse para aceitar a realidade. O fato é que o tempo foi passando, passando... e eu fui ficando.
Então chegou o ano de 1962. O mês era junho. O dia, não lembro. Como fazia todas as tardes, depois que chegava do quartel, eu estava sentado na calçada, à porta da Pensão do “seu" Xisto, onde morava. Lia A Razão e apreciava o movimento.
Carros desciam a Doutor Bozano. Pessoas transitavam, vindas das compras ou do trabalho, ou indo para eles. Do outro lado da rua a Praça Tenente João Pedro Menna Barreto (conhecida como “Praça dos Bombeiros”) recebia os costumeiros moradores do bairro e visitantes eventuais. Apesar do friozinho vespertino, crianças brincavam, namorados acomodavam-se nos bancos, pessoas idosas conversavam enquanto se aqueciam tomando o seu chimarrão.
Por instantes tirei os olhos da página que estava lendo e vi, de longe, à esquerda de onde eu estava, a moça que sempre, àquela hora, descia em direção à sua casa. Eu já a observara outras vezes, sem me deter muito nela. Nessa tarde, porém, observei-a com mais interesse. Eu não tinha detalhes muito nítidos de seu rosto, pois só a vira de longe, e mesmo agora a distância era apreciável. Mas tinha certeza de já ter passado perto dela alguma vez, de modo que não me era totalmente desconhecida.
Na esquina da Barão do Triunfo ela dobrou e logo a perdi de vista. Porém, eu sabia que ela percebera que há tempo eu a olhava. Dias depois nos encontramos. Era tão bonitinha!… E tinha um jeito de andar que era uma graça. Perguntei-lhe o nome. "Nina" – ela disse. E então, simplesmente, fiz uma segunda pergunta: “Queres ser minha namorada?”. Assim. Sem maiores preâmbulos. Naturalmente, pois qualquer coisa a mais que disséssemos não faria nenhum sentido. Olhando-me com um par de olhos azuis lindos, ela respondeu, natural e simplesmente: “Sim, quero!”
Queiramos ou não, certas situações, por mais que nos esforcemos para exorcismar, permanecem obcecando o nosso cérebro. Desde aquela manhã chuvosa de 12 de maio de 1959 eu vinha me propondo a ir embora de Santa Maria. Ali não era o meu lugar e grande parte do tempo eu passava literalmente deprimido, embora me esforçasse para aceitar a realidade. O fato é que o tempo foi passando, passando... e eu fui ficando.
Então chegou o ano de 1962. O mês era junho. O dia, não lembro. Como fazia todas as tardes, depois que chegava do quartel, eu estava sentado na calçada, à porta da Pensão do “seu" Xisto, onde morava. Lia A Razão e apreciava o movimento.
Carros desciam a Doutor Bozano. Pessoas transitavam, vindas das compras ou do trabalho, ou indo para eles. Do outro lado da rua a Praça Tenente João Pedro Menna Barreto (conhecida como “Praça dos Bombeiros”) recebia os costumeiros moradores do bairro e visitantes eventuais. Apesar do friozinho vespertino, crianças brincavam, namorados acomodavam-se nos bancos, pessoas idosas conversavam enquanto se aqueciam tomando o seu chimarrão.
Por instantes tirei os olhos da página que estava lendo e vi, de longe, à esquerda de onde eu estava, a moça que sempre, àquela hora, descia em direção à sua casa. Eu já a observara outras vezes, sem me deter muito nela. Nessa tarde, porém, observei-a com mais interesse. Eu não tinha detalhes muito nítidos de seu rosto, pois só a vira de longe, e mesmo agora a distância era apreciável. Mas tinha certeza de já ter passado perto dela alguma vez, de modo que não me era totalmente desconhecida.
Na esquina da Barão do Triunfo ela dobrou e logo a perdi de vista. Porém, eu sabia que ela percebera que há tempo eu a olhava. Dias depois nos encontramos. Era tão bonitinha!… E tinha um jeito de andar que era uma graça. Perguntei-lhe o nome. "Nina" – ela disse. E então, simplesmente, fiz uma segunda pergunta: “Queres ser minha namorada?”. Assim. Sem maiores preâmbulos. Naturalmente, pois qualquer coisa a mais que disséssemos não faria nenhum sentido. Olhando-me com um par de olhos azuis lindos, ela respondeu, natural e simplesmente: “Sim, quero!”
* * *
A partir daí o tempo passou célere. Logo ficamos noivos. O seu Cipriano, meio contrariado, a princípio e a dona Noca – que conquistei no primeiro dia – terminaram por me aceitar como futuro genro e logo me “adotaram”. Os irmãos dela se tornaram os meus irmãos. A família dela passou a ser a minha família. Mas, como nem tudo corre sempre de acordo com o roteiro, passados alguns meses, “brigamos para sempre” e desfizemos o noivado. Depois reatamos – algumas vezes, durante os cinco anos que se seguiram.
Nesse período superamos algumas turbulências, aparamos arestas e com certeza amadurecemos. Enfim, no dia 7 de janeiro de 1967, na Igreja Nossa Senhora do Rosário, diante do Padre Erasmo Dallasta e “de toda a comunidade”, casamos.
Foi quando, depois de quase oito anos morando – e vivendo – em Santa Maria, encontrei a resposta à pergunta que sempre aflorava nos meus momentos de nostalgia e que, a partir de então, nunca mais precisei fazer a mim mesmo. Agora – e possivelmente desde aquele dia de junho de 1962 – eu sabia o que estava fazendo lá.
Nesse período superamos algumas turbulências, aparamos arestas e com certeza amadurecemos. Enfim, no dia 7 de janeiro de 1967, na Igreja Nossa Senhora do Rosário, diante do Padre Erasmo Dallasta e “de toda a comunidade”, casamos.
Foi quando, depois de quase oito anos morando – e vivendo – em Santa Maria, encontrei a resposta à pergunta que sempre aflorava nos meus momentos de nostalgia e que, a partir de então, nunca mais precisei fazer a mim mesmo. Agora – e possivelmente desde aquele dia de junho de 1962 – eu sabia o que estava fazendo lá.
Vando
* * *
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(*) Sotéia – Antigo casarão onde funcionava um armazém em que se vendia de tudo – do fumo em rolo ao arame farpado, dos tecidos e acessórios de costura à erva-mate, da palha para fazer cigarros às ferramentas de trabalho e às botas de couro, da querosene Jacaré aos gêneros alimentícios e tudo mais que se possa imaginar.
(**) “QT” – Era como chamávamos as viaturas com tração total e pneus especiais, próprias para “qualquer terreno”, daí originando-se a sigla – QT – que passou a ser usada de forma genérica para designar as demais viaturas com características similares.
(***) - Burrice pura! Bastaria termos tirado o uniforme, antes, e colocado calções. Mas, com um frio desgraçado, loucos de fome e cansados de nove horas num vagão de segunda classe, acho que nos saímos bem. Salvo melhor juízo.
* * * * UMA QUESTÃO DE JUSTIÇA: Em IV - GENTE DA TERRA, acima, esqueci de mencionar uma pessoa que desde o primeiro dia que conheci, mereceu a minha admiração. Trata-se do Dr. ARY CECHELLA, médico, historiador, tradicionalista. Descendente de Família tradicional, sempre o vi como um homem culto, simples, médico humanitário e competente, além de ser amigo leal. Foi um dos fundadores do CTG Ponche Verde. Tinha um programa dominical no rádio (não recordo qual a emissora) em que resgatava fatos históricos, poesia, literatura... Faleceu em 1977, três anos depois que saí de Santa Maria. Com este adendo, presto a minha homenagem ao Dr. Cechella e a todas as demais pessoas que deixei de mencionar, as quais formaram o quadro de minhas mais preciosas memórias.
CRÉDITOS:
- Primeira foto - Do meu acervo.
- Foto do Bar do Seu Eureka - Achei no site SANTA MARIA EM FOTOS
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