A FAMÍLIA

"É preciso fazer realmente todo o esforço possível, para que a família seja reconhecida como sociedade primordial e, em certo sentido, soberana. A sua soberania é indispensável para o bem da sociedade. Uma nação verdadeiramente soberana e espiritualmente forte é sempre composta por famílias fortes, cientes da sua vocação e da sua missão na história. A família está no centro de todos estes problemas e tarefas: relegá-la para um papel subalterno e secundário, excluindo-a da posição que lhe compete na sociedade, significa causar um grave dano ao autêntico crescimento do corpo social inteiro". (João Paulo II em “Carta às Famílias” / 2 de fevereiro de 1994)

09 novembro 2014

Jubileu de estanho / 2004-2014




11° ENCONTRO E ALMOÇO DE CONFRATERNIZAÇÃO DAS FAMÍLIAS GONÇALVES, SANTOS, LIMA, MACHADO E DESCENDENTES 

Alguém, entre nós, já se deu conta de que no próximo domingo, dia 16 de novembro de 2014, durante o nosso ENCONTRO DA FAMÍLIA estaremos comemorando  10 anos de sua instituição?  É verdade! Trata-se do seu primeiro decênio. É o grande “Jubileu de Estanho”, efeméride que evoca um metal nobre e antigo, dos mais puros. Ele é utilizado desde tempos imemoriais para confeccionar espadas de reis e príncipes, de cavaleiros e membros da mais alta nobreza. Em função de menor destaque, também tem se transformado, no decorrer do tempo, em taças para vinhos, castiçais, moedas, medalhas, placas, troféus e uma infinidade de outras coisas que almejamos se tornem perenes.

       O estanho representa a Força e a Longevidade, e suas principais características são a resistência e a flexibilidade. Além disso, por ser altamente maleável, possui ponto de fusão bastante baixo e por isso é muito utilizado para soldas, sendo resistente à corrosão.

       Como descrito acima, este belo metal não lhes parece o nosso retrato? A “nossa cara”? O que acham? Reflitamos: o tempo e a convivência nos tornam maleáveis. Mesmo com um ponto de fusão baixo, “fervemos” em algumas discussões, porém podemos nos sacrificar para proteger nossos valores (nossos metais mais nobres) que resistem e perduram por toda a vida, como a união, a honra, a coesão, a dignidade, o amor à Família, a lealdade, a sinceridade, e tudo mais que prezamos e queremos transmitir à nossa posteridade.

       Pois é. E nem tínhamos pensado nisto, não é mesmo?

       Dez anos se passaram desde aquele dia memorável – 19 DE DEZEMBRO DE 2004! – quando demos o primeiro passo para a reintegração de nossas famílias que estavam, até então, bastantes dispersas como bem podemos lembrar. De lá para cá crescemos não apenas em número mas também em experiências e vivências pessoais que nos conduziram a percepções de realidades que talvez, antes, pouco significassem mas que, hoje, adquirem dimensão inusitada. E enquanto isto, nossa família continuou a expandir-se, formando novos lares e ultrapassando  fronteiras. Recebemos parentes novos que vieram acrescentar outros nomes aos  Gonçalves, Santos, Lima, Machado e descendentes  com os quais começamos. Foram chegando de mansinho, insinuando-se, agregando-se, casando com os nossos, somando-se ... e novos membros foram nascendo entre nós!

       Nestes dez anos, em decorrência das inúmeras uniões que foram nos enriquecendo, nós, os mais velhos, ganhamos muitos genros e noras, netos e bisnetos, enquanto que os menos velhos , além dos cônjuges com os quais assumiram o compromisso de darem continuidade à descendência da qual fazemos parte, foram contemplados com cunhados e cunhadas – tornados novos irmãos! – e uma porção de sobrinhos. 

       Se o decênio que estamos às vésperas de comemorar frustrou-nos pela sentida perda de vinte e dois membros da Família – alguns partindo prematuramente, – doou-nos, também, a alegria dos nascimentos que foram duas vezes mais numerosos do que o dos passamentos que precisamos lamentar. Esta é a lei da vida – A Grande Lei plena de bondade, beleza e sabedoria!   

       Num levantamento feito a partir de nossas árvores genealógicas pudemos contabilizar, no período de 2004/2014, o nascimento de 40 novos herdeiros, hoje com idades de 10 anos para menos.  São pimpolhos maravilhosos, novinhos em folha, que vieram ornamentar e oxigenar as nossas vidas e propiciar-nos a fazer deles os HOMENAGEADOS ESPECIAIS do 11° ENCONTRO. Muitos deles, com certeza, gênios em potencial, amanhã estarão nos substituindo. Colocarão em prática as lições que aprenderem de nós – e eis aí a nossa imensa responsabilidade! – mas, seguramente, saberão fazer melhor: administrar com prudência e retidão o novo mundo que lhes caberá comandar – um mundo mais belo, mais humano, mais solidário, mais feliz.

       Esse será um dia para comemorar. Para render Graças. Para celebrar a memória dos que já não estão conosco, render gratidão ao presente e louvar o futuro. Para vibrar de alegria por estarmos juntos mais uma vez no ENCONTRO que se tornou o símbolo mais autêntico de nossas famílias. E um dia, principalmente, de dar as boas vindas a esta plêiade de pequeninas estrelas que o Amor do Pai nos confiou no decorrer deste decênio e às quais, com imenso carinho e a aquiescência de vocês, este 11° Encontro da Família é dedicado.

       Por isto, brindemos, desde já, mais uma vez. Outras vezes. Muitas vezes. A eles e a nós. Brindemos e extravasemos o nosso júbilo. Nós merecemos!

       Até domingo que vem!

Vando

01 novembro 2014

Solilóquio

UM SOPRO, UMA BRISA 

Que falta nos fazem hoje as rezas de Nhá Miúda!... 

       Sapinho, quebranto, soluços, mau olhado... nada havia que resistisse às rezas e benzeduras de Nhá Miúda. Para mordida de cobra, picada de escorpião, mijada de aranha, espinha de peixe atravessada na garganta, o tratamento era reforçado com chás e ferveduras que só ela sabia fazer, guardiã que era de segredos herdados de gerações imemoriais.

       Nhá Miúda tinha também outras habilidades, como a de parteira. Chamava de “meu fío” e “minha fía” a todos aqueles a quem suas mãos hábeis e carinhosas ajudaram a vir ao mundo. E contavam-se às dezenas. Não havia hora, nem mau tempo, nem distância, que servissem de empecilho para que ela exercitasse seu trabalho abnegado.

       A fama de boa cozinheira corria de boca em boca. Embora não sendo comum receber visitas, com frequência comentava-se que fazia bolos de milho, carne de panela e ambrosias “com mãos de fada”.

       Ninguém sabia que idade tinha. Apesar dos passos lentos e das costas levemente recurvadas, o que a obrigava a apoiar-se se num velho bastão de madeira à guisa de bengala, estava sempre em atividade. Percorria, sem cansaço aparente, longos trajetos, que mesmo para os mais jovem já seriam exaustivos.

       Cena comum era vê-la carregando uma cesta repleta de laranjas e bergamotas que distribuía prazerosamente a todos os que pelo caminho ia encontrando. Não vendia. Dava-as de presente, apenas. Colhia-as do pomar que ela mesma cuidava e cultivava, no vasto quintal onde se erguia a velha casa onde morava solitária e tranquila em sua vida pacata e sem outras atribulações que não fossem as chamadas para socorrer alguma parturiente da vizinhança.  

       Pouco conversava e sobre a família, suas origens, seu passado, jamais falava, talvez porque as pessoas não ousavam perguntar. Sentiam receio de intrometerem-se em assunto que não lhes dizia respeito. Negra, poderia ter sido escrava. Quem sabe não o fora?!... Ama-de-leite... sim, poderia ter sido. Ou aia de uma dama nobre, de alguma rainha... Ela mesma, embora a idade e a postura um tanto comprometida, tinha porte de rainha! Teria sido rainha? Onde andariam e quem teriam sido os seus súditos?

       A casa em que vivia não se assemelhava muito a um palácio. Pouco melhor do que um casebre, mesmo assim era limpa, bem arrumada, com os móveis apenas suficientes para as suas necessidades. Não era a proprietária, e supunha-se ser de um filho que ninguém jamais vira nem sabia ao certo quem era ou se alguma vez existiu. Bondosa, possuidora de extrema simpatia, rosto onde predominavam os traços de antiga beleza, seu olhar era franco e inspirava confiança e respeito. Guardava muitos segredos, não somente sobre a própria existência, como acerca das pessoas que conhecia e com as quais se relacionava.

       De quantas histórias teria sido testemunha, ou protagonista, ou a personagem principal?!...

       ...

       São passados muitos anos e agora, não sei por que, a lembrança de Nhá Miúda me veio à mente. Assim. De repente. Sem mais nem menos.  

       Posso dizer que a narrativa que fiz é tudo o que registra, pelo menos em minha memória, a passagem dessa mulher misteriosa em alguns capítulos esparsos de minha própria história. É a história singela e sutil, quase um sopro, uma brisa, de quem, como, ela, se perdeu, anônima, nas brumas de um pretérito quase perfeito, não fosse o seu súbito ressurgimento.

       Quem seria, na verdade, Nhá Miúda? Que nome teria?!... Josefa, talvez... Ou Genoveva. Ou Anastácia? Quem sabe...  Augusta? Sim, Augusta! Por que não me ocorreu, antes? Combina muito com ela – nome de rainha.

       Quando a vi pela última vez eu não era nem adolescente. Teria uns dez, onze anos... Não mais. Menos, possivelmente. A vida sofreu uma ruptura tão instantânea, que eu não percebi  que Nhá Miúda, numa fração de segundo, deixou de fazer parte de uma história que nunca teve início, pois não sei situá-la no tempo. E que, não tendo meio, nem continuidade, também não teve fim. Ficou suspensa, atemporal, em algum lugar de nossas origens, à espera de que algum dia ressurja ainda que envolta por tênue luminosidade.

Vando

* * *

Foto: do site “IMPRENSA BR” 

01 outubro 2014

Comecemos com poesia

UM DIA, UMA HISTÓRIA

    Hoje é o primeiro dia do mês, mas veio-me à lembrança a data de 31 de outubro de 1981, coincidentemente o último. Quando a efeméride me ocorreu, achei que foi domingo, pois recordo que tinha sol. Aquele sol radiante que só acontece nos domingos de primavera da Praça da Alfândega, entre as palmeiras e os jacarandás floridos.  Mas me equivoquei nos meus cálculos: era um sábado!

    Na quarta feira, dia 28, havia iniciado a 27ª Feira do Livro de Porto Alegre. E, como até hoje fazemos desde mil novecentos e antigamente, andávamos, eu e a Nina, pela Praça, entre as "barracas", deliciando-nos com o cheiro dos livros novos e garimpando os balaios onde se encontram sempre agradáveis surpresas a preços ridículos, muitas delas com cheiros antigos. Principalmente nos primeiros dias da Feira, pois as preciosidades se esgotam logo. Nesse dia estavam juntos o meu filhote, Marcelo, então com sete anos, e minha cunhada, Maria, recém chegada de Santa Maria para passar uns dias com a gente. 

    Curtíamos a Feira, que era pura festa. Pelo alto-falante, ouvimos o anúncio dos autores e das personalidades presentes, entre os quais estava alguém que há muito eu considerava como pessoa da nossa família. Com freqüência nos encontrávamos na Rua da Praia, pelas imediações da Praça da Alfândega, na Livraria do Globo ou, eventualmente, em algum outro lugar. Nunca conversei com ele. Apenas cumprimentava-o, sempre que nossos caminhos se cruzavam: "Bom dia, Poeta!" – ao que ele me correspondia com um sorriso maroto, meio tímido, meio irônico, difícil de definir. Fazia tempo que eu devorava avidamente seus livros e até já sabia de cor alguns de seus poemas. Era um dos meus gurus, ao qual passei a dedicar um carinho muito especial. Seu nome - Mario Quintana!...

    Por uma dessas coincidências que só ocorrem em dias de suprema graça, tínhamos adquirido, poucos minutos antes, três de seus livros. Para mim comprei "Apontamentos de História Sobrenatural", da Editora Globo, editado em 1976, e "Pé de Pilão", da Garatuja, editado em 1975 para meu filho. Minha cunhada comprou “A Vaca e o Hipogrifo”, também da Garatuja, de 1979. Como a sorte nos sorria, não podíamos perder a oportunidade de conversar com o Poeta, de vê-lo, de conseguir um autógrafo. 

    Entramos na fila. Uma fila enorme. Chegada a nossa vez, trocamos breves palavras. Não falamos muito, pois atrás de nós se postava uma quantidade incalculável de admiradores ansiosos para que chegasse a sua vez. No meu livro, ele escreveu: "Para o Evandro Inácio uma lembrança muito amiga do Mario Quintana", e no "Pé de Pilão" sua caligrafia inesquecível deixou registrado: "Para o Flávio Marcelo, com um abraço do amigo velho, Mario Quintana". 

    Não lembro o teor do autógrafo que ele deu para a Maria, mas todos nós saímos felizes, realizados, pois mais do que uma lembrança ditosa que levaríamos para toda a vida, ganhamos o melhor presente que podíamos esperar, qual seja o de estar com o nosso maior Poeta, ainda que por um instante breve. Efêmero. De súbito!

Vando

* * *

Notas minhas:

(1) De súbito” – Expressão muito comum na obra do Poeta. 

(2) Em 29 de outubro de 1982, (32 anos atrás) Mario Quintana é agraciado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul com o título de Doutor Honoris Causa.

Crédito / Foto - Liane Neves 

01 setembro 2014

01 agosto 2014

Prenúncio da primavera?!...

OS IPÊS FLORESCEM DE NOVO
(... mas não é só isto) 

    Hoje vou falar sobre duas coisas de que gosto muito. Começo, naturalmente, com a primeira delas – e nem poderia ser diferente. 

    No meio da semana, chegando em casa, reparei que os ipês do condomínio onde moro já estavam com alguns botões se insinuando, prestes a desabrochar. Hoje cedo, ao abrir a janela, percebi, jubiloso, que a “promessa” dos dias anteriores estava se cumprindo. O que era apenas o início da brotação transformou-se, da noite para o dia, em milhares de flores rosadas (minha vizinha, “perita” em botânica e apaixonadamente dedicada a cuidar dos jardins, me garante que se trata de “Ipê roxo”) colorindo de alegria a paisagem até então carente de graça. 

    Como ainda estamos no dia primeiro de agosto, faltam quase dois meses para que a primavera, propriamente dita, se reapresente no esplendor de sua beleza. Mesmo assim, os ipês diante da minha janela já antecipam o que será a próxima estação – a mais bonita do ano, sem qualquer sombra de dúvida. Logo os “outros” ipês – amarelos, azuis, escarlates e de todas as tonalidades “solferinas”, – depois os jacarandás, os guapuruvus... entrarão nesta verdadeira festa que, todos os anos, faz a alegria dos nossos olhos e marca o renascer de nossos sonhos acalentados durante o período chuvoso, frio e cinzento, característico do clima aqui ao Sul do Mundo.   

    Agora vem a segunda. Neste dia 1° de agosto, comemora-se no Brasil o DIA DO FILATELISTA. Oficialmente é o “Dia do Selo”, quando a história registra a emissão do primeiro selo postal brasileiro. Na realidade, não foi “um selo”, mas três, numa série de 3 valores: 30, 60 e 90 réis. São os chamados “Olhos de Boi”. Isto ocorreu no dia 1° de agosto de 1843 e nessa data o Brasil foi o 3° país a adotar a “invenção” de Sir Rowland Hill (3 Dez 1795 – 27 Ago 1879). 

    Sir Howland Hill era um professor britânico e membro do parlamento do Reino Unido. Até o início do ano de 1840, as cartas que eram levadas aos destinatários tinham a tarifa paga por estes. Como resultado, muitas dessas correspondências eram recusadas, pois os destinatários se negavam de pagar. Devolvidas ao correio, causavam grandes prejuízos financeiros ao serviço postal de Sua Majestade. Em vista disto, Howland propôs ao Parlamento que a taxa pelo serviço fosse paga pelo remetente. Para isto foi criado de comprovante de pré pagamento, que deveria ser afixado à carta. A partir daí nasceram os selos postais, pequenos retângulos de papel que mudaram a história postal.  

    A primeira emissão dessas hoje preciosidades, ocorreu na Inglaterra no dia 6 de maio do ano de 1840. Consistia numa peça de papel impressa em cor preta, no valor de um Penny, nome com o qual passou a ser conhecido o primeiro selo do mundo: o “One Penny Black”, do qual restam raríssimos exemplares, atualmente, cotados no mercado filatélico a preços astronômicos. 

    O segundo país a emitir selos postais foi a Suíça onde, nos Cantões de Zurique e Genebra, passou a circular no dia 23 de janeiro de 1843. 

     É claro que vocês já conhecem o assunto. Como também sabem que sou filatelista “desde criancinha” e um apaixonado por esses minúsculos brinquedinhos com os quais convivo desde tempos imemoriais. Só falei deles porque hoje é o seu dia. E porque gosto tanto de selos como gosto de tempo bom, de passarinhos cantarolantes e de primavera. Primavera como a que os ipês de onde moro estão, sutilmente, me avisando de que logo, logo, vai chegar. 

     Então, me digam: eu poderia deixar de compartilhar com vocês estas duas alegrias?!... 

Vando 

* * * 

Foto: Ipê roxo / Autoria: Maria Olívia
Site: PORTFOLIO-PRESS 

17 julho 2014

Centenários de nossa História - I

O “VÔ BIBI” E A VÓ JÚLIA

    No dia 27 deste mês de julho, a história de nossa Família registra o 102° Aniversário do casamento de Odorico Hermógenes dos Santos – o “Vô Bibi” – com Júlia Figueira dos Santos, celebrado em Porto Alegre no ano de 1912.

    Odorico nasceu em Porto Alegre, RS, no dia 8 de julho de 1884, e era filho de Jacintho Hermógenes Medina dos Santos (1860 – 1931) e de Isolina Fernandes dos Santos (nascida em 1867 e falecida no dia 12 de abril de 1934). Teve mais sete irmãos: Resoleta, Ismael, Manoelita, Sebastião, Guacita, Lourenço e Maria. Faleceu em Porto Alegre, RS, no ano de 1936, com idade aproximada de 52 anos.  

    Júlia também era natural de Porto Alegre, nascida no dia 19 de agosto de 1895, e na data do casamento tinha 17 anos (Odorico estava com 28). Filha de Bernardino Figueira e Mathilde Figueira, teve duas meio-irmãs: Cecília e Judite, filhas de segundas núpcias de Mathilde. A “Vó Júlia” faleceu em Porto Alegre, RS, em 1948, com 53 anos.

    De seu casamento, Odorico e Julia tiveram um casal de filhos – Romeu (14 Nov 1914 – 10 Abr 1998) e Julieta (1916 – 1832). Seu legado em número de descendentes foi bastante modesto: vinte e duas pessoas – apenas dois filhos, oito netos, 7 bisnetos e cinco tataranetos. Há a considerar que esta geração deve-se apenas à descendência de Romeu, já que a irmã deste, Julieta, faleceu prematuramente aos dezesseis anos, ainda solteira. Tivesse ela vivido mais anos e contraído matrimônio, o número de descendentes seria, com certeza, consideravelmente maior.

    Guardo uma certa mágoa por não ter conhecido o Vô Odorico, pois no ano do meu nascimento ela já havia falecido. Imagino que teríamos nos dado muito bem, pelo pouco que sei a respeito dele. Quanto à Vó Júlia, conservo delas muitas lembranças boas. Não era do seu feitio “contar histórias” – como a Vó Mathilde que conhecia uma infinidade delas. Entretanto, possuía um talento inato para as artes manuais. De seu artesanato recordo de muitos belos desenhos a lápis e nanquim; pinturas em porcelana e cerâmica; bordados e costuras, nos quais era exímia. Seu quarto – e grande parte das peças da casa onde morávamos – era o seu atelier e ao mesmo tempo o “hospital” de pronto socorro de bonecas com cabeças, braços e pernas de biscuit que por mais danificadas que estivessem ela conseguia reconstituir à perfeição, com perícia e sensibilidade, além de confeccionar para elas vestidos, calçados, luvas, chapéus e todos os demais penduricalhos, tudo  novinho em folha, que ela criava segundo os mais elegantes figurinos da época.

    Pois é isto. Talvez um dia eu me disponha a narrar algumas das ternas reminiscências que, vez por outra, penso em compartilhar com vocês. Hoje, todavia, não o farei, limitando-me a deixar registrada esta efeméride dos 102 anos do casamento de Odorico e Júlia. Meus avós paternos. Pais do “seu” Romeu.

Vando 

25 junho 2014

Optar ou não optar?


A CAPITULAÇÃO DO JOCA



– Oi, rapaz! Que prazer encontrá-lo. Como vão as coisas?

– Vão indo. Tudo bem. E você, como tem passado?

– Sabe como é. Trabalhando sempre. E o seu blog, como vai?

– Assim… assim…

– Você não me parece muito animado. Algum problema?

– É. Realmente o blog não tá dando muito certo. Eu tentei, mas o pessoal não tá nem aí, pra ele. To pensando em jogar a toalha.

– A coisa não me parece tão desoladora assim. Andei olhando ele e achei bem bonzinho.

– Ah, dúvida cruel! É o velho dilema. Não foi o Shakespeare que disse “não sei se caso ou compro uma bicicleta”? Ou terá sido o Freud? A conotação me parece bem freudiana.

– Agora você deu prá fazer brincadeirinha, é? De repente virou piadista! Um sujeito tão sério, culto, compenetrado, sempre envolvido com coisas transcendentais…  

– É verdade. Mas acho que aí é que reside o problema. Dá uma olhada nesta crônica que escrevi recentemente. Eu ia publicar ontem, mas estou indeciso. Não sei se vão entender.

– Dá cá. Deixa eu ver.

– ???… E então?

– Se eu fosse você não escreveria isto. Aliás, escrever você já escreveu. Agora não adianta mais. Quero dizer que não publicaria.

– Você acha? Por que?

– Porque ninguém vai ler. O texto é excelente. O tema é de uma profundidade que me lembra os “Sermões” do Vieirinha. A construção das frases é irretocável. O seu estilo é de dar inveja ao Fernandinho, ao Bill e até mesmo ao Camões, mas está muito extenso e ninguém lê mais do que cinco linhas. Quando lê!…

– Mas… se eu resumir ela vai ficar incompreensível. Não consigo dizer nem a metade do que eu queria.

– Pois é, meu velho. Lamento, mas você pediu a minha opinião. Estou sendo sincero. Mas sinto ter que repetir: ninguém vai ler.

– Então você está convicto de que a minha carreira de escritor não tem nenhuma perspectiva de futuro, não é assim?

– Sim, tenho certeza. Na época em que vivemos, as pessoas lêem no máximo as manchetes do “Diário dos Pampas” e, mesmo assim, só as que trazem notícias da “Copa” e a crônica policial. Ah!… e o caderno da TV prá saber quem é o atual namorido da atriz principal “daquela novela” e quanto ela vai ganhar pra posar para a Play Boy.

– Portanto, você acha que não vale a pena publicar nem este nosso diálogo, não é isto? Ele já está com o dobro do tamanho que alguém se interessaria de ler.

– Pois é o que lhe digo. De qualquer modo, posso dar-lhe um conselho – ou melhor, uma sugestão?

– Sim, fique à vontade. Afinal, somos amigos e temos toda a liberdade pra isto.

– Arranje outro “hobby”. Esqueça o blog e pare de escrever. Ou vice-versa. Há tantas coisas interessantes prá se fazer. Mas antes, pra ir se acostumando, invente algo parecido. Dentro da área, pra começar. Você tem talento e vai se dar bem, tenho certeza.

– Mas… o que, por exemplo?

– Que tal uma coluna semanal nos jornais de grande circulação? Uma seção de horóscopo - quem sabe? - vai ter bastantes leitores. Ou de gastronomia – “O Anonimous Gourmant”, só pra fazer concorrência com o "outro“. É só pra mudança não ser tão brusca.

– ???

– Vejamos… hum!!!… “O Joca responde”! Ou “A Coluna do Joca”.  Isto!… O que acha? Na verdade você nem precisa mais ter o trabalho de escrever. Contrata alguém. Uma assessoria. Eles escrevem, pesquisam, colam e copiam, colocam o teu nome e faz de conta que a matéria é tua. De qualquer modo, dependendo do tema, ninguém vai ler, mesmo. Aí te sobra tempo prá outras atividades. Prá viajar, por exemplo. Pelo Caribe. Pela Pérsia. Pela Foz do Iguaçu, Bolívia, Venezuela… Vai conhecer o mundo, rever os velhos amigos… tomar umas que outras...

– Isto não vai dar certo!...  Não é do meu jeito.

– Então leia, apenas. Você gosta tanto. Só procure não se estressar demais. Evite romances, novelas, épicos, ficção, história, ensaios, economia e coisas do gênero. Eles são muito longos, cheios de mistérios, de enredos complicados, de passaegens que exigem pesquisa, reflexão, você sabe, né? Enchem o saco. São mais exaustivos do que exercício em esteira. (... Acho que alguém já disse isto alguma vez, só não lembro quem!...).

– Puxa, rapaz! Você teve uma idéia brilhante! Que argumentação! Me convenceu e vou seguir seu conselho. Quer dizer, a sua sugestão. Este negócio de escrever já estava ficando meio chato, mesmo. Obrigado, amigo! Obrigado, do fundo do coração! Você é mais que um amigo; é um irmão. É o meu guia, o meu guru, o meu anjo da guarda. O meu flanelinha particular. Minha gratidão será eterna como um epitáfio. 

– Você está brincando? Assim, de súbito, toma uma decisão tão séria?

– Claro. Você me abriu os olhos. A partir de hoje passo a ser um simples leitor. Vou começar a ler tudo o que puder. Desde que não tenha mais do que quatro ou cinco linhas. Afinal ninguém é de ferro.

……… 

E a partir daquele dia o Joca nunca mais voltou a escrever. 

                                                                        Vando 

                                                                          * * * 

P. S. - Esta historinha não é original nem inédita. Publiquei-a, primeiramente, em meu saudoso blog “Rabiscos e Garatujas”, alguns anos atrás. A que agora publico sofreu algumas alterações – poucas – que, no fundo, em nada modificaram o tema. “Atualizei-a” – digamos assim. Às vezes tenho vontade de ressuscitar o Joca, personagem que criei inspirado em alguém a quem muito prezo. A idéia não se dissipou de todo. Assim, a qualquer momento ele – o Joca – pode reaparecer. Espero.

* * * 

CRÉDITO ILUSTRAÇÃO:

29 maio 2014

Esbanjar é preciso

SEMPRE FICA ALGUMA COISA 

Na tentativa de resgatar o que ainda sobra deste mês, que para mim foi literariamente estéril, transmito a vocês uma mensagem de esperança. Aliás, não bem esperança, mas uma compensação da qual vale o registro:

Os dedos foram-se todos. Felizmente salvaram-se os anéis. Ou, resumindo, nem tudo está perdido.

Que o mês vindouro seja mais prodigioso pra todos nós.

Vando

* * *  

CRÉDITO: Foto do site SOUDIVA  

29 abril 2014

De almas e maresia

O POETA DO MAR DA BAHIA

“Mar, metade da minha alma é feita de maresia”
Sophia de Mello Breyner Andresen
(Porto, 6 Nov 1919 – Lisboa, 2 Jul 2004)
       
Abril está chegando ao fim e até agora não escrevi nada que pudesse ser aproveitado para publicar aqui. De repente, lembrei-me do verso em epígrafe, que li em algum lugar de minhas andanças. Por uma associação de idéias, veio-me à mente outra pessoa que dedicou sua vida a compor poesias para o mar e que, coincidentemente é relembrado pela passagem do centenário de seu nascimento. Trata-se de Dorival Caymmi.

    Evocando este poeta, compositor e cantor de extrema sensibilidade, também lembrei de outra frase, lida ou ouvida não sei onde – mas há muito tempo – que dizia mais ou menos isto: “o mar estava tão caymmi que o náufrago morreu feliz”. Não me perguntem o autor, porque não sei. Apenas guardei de memória e agora surge a oportunidade de reproduzi-la.

    Pois bem. Falemos, então, deste artista que colecionou fãs de todas as idades, em todos os lugares do Brasil e de outras partes do mundo, numa vida que durou mais de 94 anos. Dorival Caymmi nasceu na Cidade de Salvador, BA, no dia 30 de abril de 1914. Sua inspiração eram os costumes e tradições da Bahia, sua terra natal, quando falava de amores, de saudades e do mar, que foi tema de muitas de suas composições. Quem não lembra de versos como este: “o mar quando quebra na praia é bonito, é bonito”. Ou de quando ele falava dos pescadores, de seus sonhos, de suas dores, de suas vidas mescladas de trabalho rude e de romance: “o pescador tem dois amores, um bem na terra, um bem no mar...” e tantos outros?

    Caymmi foi pura poesia. Dedicou-se também à pintura, com a qual revelou ao mundo seu talento pictórico. Mas foi como músico e compositor que teve destaque e como será sempre conhecido. Dentre as diversas composições que nos legou, temos "Samba da Minha Terra", “Suite dos Pescadores”, “O Mar”,  "Marina", "Samba da Bahia", "O Dengo Que a Nega Tem", “Maracangalha”, "Saudade de Itapoã", “Prece ao Vento”,  “Saudade de Bahia”, “Doralice”, “Modinha para Gabriela”, “Rosa Morena”... numa mistura saborosa de sons, romantismo, acordes, rimas, preces telúricas e de todos aqueles ingredientes “que só a Bahia tem”, incluída, naturalmente, a maresia da qual sua alma, certamente, era composta em bem mais do que a metade, como se descreveu a si própria a poetisa portuguesa.

    Caymmi faleceu no Rio de Janeiro, RJ, no dia 16 de agosto de 2008, mas continua vivo na memória e no carinho que seu número incontável de admiradores lhe dedica, sendo merecedor de todas as homenagens que lhe estão sendo prestadas nesta data que marca o centenário de seu nascimento.

Vando

* * * 

Foto: Evandro Teixeira – no blog "TALENTO E ARTE"

21 março 2014

Monólogo outonal


SEJA BEM-VINDO, OUTONO!
    Como somos inconformados!… A vida é assim desde que o mundo é mundo. Contudo, ansiamos por mudá-la, moldá-la aos nossos caprichos e necessidades – estas, quase sempre, imaginárias, pré-fabricadas e irreais.  
     O problema é que vivemos esbarrando em nossas fragilidades. Tropeçamos, caímos muitas vezes e levantamos outras tantas, nem sempre com o entusiasmo que a façanha requer. Mas… tudo bem!… Tais divagações não vão me conduzir a lugar algum nem a nada que valha a pena. Não passam de um exercício de meditação a que gosto de me submeter de vez em quando.
    O importante é a rosa – ou melhor, a primavera que faz a rosa desabrochar. A propósito: qual será mais importante – a rosa ou a primavera?!… Ah, incertezas! Sempre elas!...
    E depois vem o verão. É quando extravasamos o nosso humor suando às bicas, nos mudando para a praia onde as insolações, as micoses e os mosquitos não dão trégua, nos enxarcando de chope gelado e mandando às favas todos os regimes minuciosamente planejados. E mais adiante, recomeçando, o outono, o inverno, as estações se sucedendo… e a Vida, com inicial maiúscula, que se oferece a cada um, abundante, gratuita – e, felizmente, no mais das vezes, graciosa – plena de energias, com propostas sedutoras, alternativas miraculosas e surpresas mirabolantes, obrigando-nos a criar todos os dias uma nova coreografia para o jogo de cintura que já deixou de funcionar, coagindo-nos a nos adaptar aos novos desafios cujos propósitos e circunstâncias são sempre difíceis de assimilar e nunca conseguimos compreender. 
    O que tem tudo isto a ver com o recado que eu pretendia dar, ou com a nova estação? Penso… penso… e não atino. Parecem coisas desconexas. Na verdade, são. Ou não são?!...  Devo admitir que não sei. Nem me detive em avaliar com mais atenção. Sendo assim, e já que não tem outro jeito, permitam-me concluir este circunlóquio, antes que me enrede mais, pois quanto mais escrevo mais me afasto do tema que – a bem da verdade – eu nem sei mesmo qual era.
    Que o outono seja bem-vindo, mas que a primavera não demore a voltar. Ela, sim, é que dá à vida o sabor perene de uma grande festa e nos propicia a oportunidade de começar tudo de novo.

Vando 
* * * 
Foto: Minha. Garibaldi, RS, 2012 

26 fevereiro 2014

Desaposentado, graças a Deus!

DESAPOSENTADO





    Ele chegou à praça com uma marreta, endireitou a estaca de uma muda de árvore e firmou batendo com a marreta, amarrou a muda na estaca e se afastou como para olhar uma obra de arte. Não resisti a puxar conversa:

    - O senhor é da prefeitura?

    - Não, sou da Alice, faz quarenta e dois anos. Minha mulher.

    - Ah... Foi o senhor quem plantou essa muda?

    - Não, foi a prefeitura. Uma árvore velha caiu, plantaram essa nova de qualquer jeito, mas eu adubei, botei essa estaca aí, olha que beleza, já está toda enfolhada. De tardezinha eu venho regar.

    - Então o senhor gosta de plantas.

    - De plantas, de bicho, até de gente eu gosto, filho.

    - Obrigado pela parte que me cabe.

    Ele sorriu, tirou um tesourão da cinta e começou a podar um arbusto.

    - O senhor é aposentado?

    - Não, sou desaposentado.

    Foi podando e explicando:

    - Quando me aposentei, já tinha visto muito colega aposentar e murchar, que nem árvore que você poda e rega com ácido de bateria. Sabia que tem comerciante que rega árvore com ácido de bateria pra matar, pra árvore não encobrir a fachada da loja? É, aí fica com a loja torrando no sol.  

    Picotou os galhos podados, formando um tapete de folhas em redor do arbusto.

    - É bom pra terra, tudo que sai da terra deve voltar pra terra. Mas, então, eu já tinha visto muito colega aposentar e murchar. Botando bermuda e chinelo e ficando em casa diante da televisão. Ou indo no boteco pra beber cerveja, depois dormindo de tarde, engordando... Até que acabam com derrame ou enfarte, de não fazer nada e ainda viver falando de doença.

    Cortou umas flores, fez um ramalhete:

    - Pra minha menina, a Alice. Ela é um ano mais velha que eu, mas fica uma menina quando levo flor. Ela também é desaposentada. Ajuda na escola da nossa neta, ensinando a merendeira a fazer doce com pouco açúcar e salgados com os restos dos legumes que antes eram jogados fora. E ajuda na creche também, no hospital. Ih, a Alice vive ajudando todo mundo, por isso não precisa de ajuda, nem tem tempo de pensar em doença.

    Amarrou o ramalhete com um ramo de grama, depositou com cuidado sobre um banco.

    - Prá aguar as mudas eu tenho que trazer o balde com água lá de casa. Fui na prefeitura pedir pra botarem uma torneira aqui. Disseram que não, senão o povo bebe água e deixa vazando. Falei pra botarem uma torneira com grade e cadeado que eu cuido. Falaram que não. Eu teria que ficar com o cadeado e então ia ser uma torneira pública com controle particular, e não pode. Sorriu, olhando a praça.

    - Aí falei: então posso cuidar da praça mas não posso cuidar de uma torneira? Perguntaram, veja só, perguntaram se tenho autorização pra cuidar da praça. Nem falei mais nada. Vim embora antes que me proibissem de cuidar da praça... Ou antes que me fizessem encher formulário em três vias com taxa e firma reconhecida, para fazer o que faço aqui desde que desaposentei. Tá vendo aquele pinheiro fêmea ali? A Alice que plantou. Só tinha o pinheiro macho. Agora o macho vai polinizar a fêmea e ela vai dar pinhões.

    - Eu nem sabia que existe pinheiro macho e pinheiro fêmea. 

    - Eu também não sabia, filho. Ih, aprendi tanta coisa cuidando dessa praça! Hoje conheço os cantos dos passarinhos, as épocas de floração de cada planta, e vejo a passagem das estações como se fosse um filme!

    - Mas ela vai demorar pra dar pinhões, heim? - falei olhando a pinheirinha, ainda da nossa altura, mas ele disse que não tem pressa.

    - Nossa neta também é criança e eu já falei pra ela que é ela quem vai colher os pinhões. Sem a prefeitura saber, né... e a Alice falou que de cada pinha que ela colher, deve plantar pelo menos um pinhão em algum lugar. Assim, no fim da vida, ela vai ter plantado um pinheiral espalhado por aí. Sem a prefeitura saber, é claro, senão podem criar um imposto pra quem planta árvores... 

    Falei que é admirável ver alguém com tanta idade e tanta esperança, e ele riu:

    - Se é admirável eu não sei, filho, sei que é gostoso. E agora dá licença que eu preciso pegar a Alice pra gente caminhar. Vida de desaposentado é assim: o dinheiro é curto, mas o dia pode ser comprido, se a gente não perder tempo! 

Domingos Pellegrini 

* * *

- CRÉDITOS –

Texto: Extraído da página de Antonio Carlos Mesquita do Amaral, no Facebook.
Imagem: “Gardner”, óleo sobre tela, 1882 / Georges-Pierre Seurat (Paris, 2-Dez-1859 - Paris, 29-Mar-1891)


24 fevereiro 2014

Rabiscos do meu caderno


ANOTAÇÕES NO PÓS-CHUVA 

SOBRE O TEMPO E A MODERNIDADE 

Estamos vivendo em outros tempos. Mais céleres e menos sentimentais. Menos espirituais. Menos poéticos. Somos práticos. Objetivos. Não temos mais sonhos, apenas pressa. Muita pressa. Tempo é dinheiro!… Não mais nos prendemos a recordações nem a “superficialidades”. Quando dizemos “eu te amo” ou “estou com saudade” nossas palavras não são, nem de longe, o reflexo fiel do que se passa no nosso coração… Aceitemos ou não, tudo ficou vulgar. A vida se vulgarizou. Nós nos vulgarizamos.

A ORIGINALIDADE E O ÓBVIO 

Nunca conseguiu fugir da banalidade. As histórias que escrevia eram sempre medíocres. Todas tinham começo, meio e fim. 

DAS SUPOSIÇÕES 

Eu sei que sabes muito mais do que suponho. Também sabes que eu sei mais do que imaginas que eu possa saber. Mas... que utilidade tem isto!?... 

DESDE O TEMPO DO BARATO 

O passar do tempo nos ensina muitas coisas que, afinal, podemos resumir a poucas. Eu, por exemplo, dentre tudo o que descobri, cheguei à conclusão de que na vida há três coisas que custam muito caro. Os olhos da cara, para ser mais exato. Quais?... Quais?... Já lhes satisfaço a curiosidade: a glória, a pobreza e a burrice. Mas, parafraseando o Apóstolo, dentre estas a mais excelente é a burrice. Nada se sobrepõe a ela. 

SOBRE CHARADAS E CARTAS ENIGMÁTICAS 

Antigamente – bem antigamente!... – eu gostava era das “charadas”. Alguém lembra? Havia as “novíssimas”, as “sincopadas”, “as “matemáticas”... para mencionar apenas algumas. Mas bem antes – tanto quanto sei - havia as “cartas enigmáticas”, redigidas com poucas letras e muitos números e figuras. Mas as minhas favoritas, mesmo, eram as palavras cruzadas. Foi com elas que aprendi que o antigo nome da nota dó era ut. E daí? – vocês poderão perguntar. Não, nada demais. Um pouco de cultura inútil é sempre bom pra enganar a nós mesmos. 

DOS MALES, O MENOR 

Os dedos?!... Ora, os dedos!... Que vão-se todos. O importante é que se salvem os anéis!... 

VISÕES ANACRÔNICAS 

Morava além dos alcantis, entre píncaros e pináculos. Afeito à haliêutica permaneceu, ainda assim, em casa, resguardando-se da algidez do dia. Por trás do reposteiro, observava a paisagem cinzenta comprometida pela presença do algibe anacrônico que agora só servia para a proliferação das larvas. 

Vando 

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- CRÉDITOS -